No último dia 15 de setembro foi finalizada a consulta pública promovida pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) que se prepara para aplicações de sanções previstas na LGPD. Esta consulta cumpre um requisito previsto na Lei Geral de Proteção de Dados — LGPD (Lei 13.709/2018) e teve como objetivo ouvir a sociedade sobre a minuta de resolução que regulamenta a aplicação de sanções no caso de descumprimento ou violação na proteção de dados pessoais.
Como este mês de outubro guarda muitas expectativas no varejo sobre o início das aplicações dessas sanções (multas, suspensões e outras penalidades), convidamos o Dr. Flávio Perboni, pós-graduado em direito digital e membro da Comissão de Proteção de Dados e Privacidade da OAB/SP e o Thiago Spejo, CEO e Co-Founder da Idever Inteligência para analisar os impactos dessas sanções e fazer um balanço dos quatro anos desde a promulgação da lei.
Consulta pública facilitará aplicação de sanções
A LGPD, criada garantir a proteção no tratamento de dados pessoais, completou quatro anos de sua promulgação e dois anos de vigênciaem agosto de 2022. A aplicação de sanções, no entanto, passou a ser possível somente após agosto/2021. Apesar de estar há dois anos em vigência, ainda são muitas as empresas que não estão adequadas totalmente à norma, incluindo alguns varejistas.
A ANPD tem recebido denúncias de violação de dados de segmentos diversos, mas tem tido dificuldades para aplicar as sanções administrativas devido à ausência de uma regulamentação e metodologia (norma de dosimetria), fator que deverá ser sanado agora após a consulta pública à sociedade.
A consulta pública está cumprindo uma obrigação já prevista na LGPD onde a Autoridade Nacional deveria editar um regulamento para definir os critérios (dosimetria) para encontrar o valor das sanções.
Balanço sobre as finalidades da LGPD
Avaliando se estamos alcançando as finalidades pelas quais a lei foi criada, o dr. Flávio Perboni diz que a LGPD trouxe muita inovação e uma forma respeitosa em relação aos dados dos cidadãos e das empresas que utilizam esses dados. “A lei vai tratar sobre a necessidade desses dados circularem para movimentar e desenvolver a economia revertendo em vantagem para o próprio cidadão, preservando os seus dados e seus direitos”, comenta Perboni.
O advogado reconhece que a LGPD é uma lei muito importante e que já vem criando uma cultura, mas ainda há muito a caminhar para surtir efeitos em plenitude na sociedade. Em relação à adesão das empresas, Perboni acredita que muitas não estão em conformidade com a norma, o que causa preocupação. “Eu acho que a partir do momento que você estabelecer este regramento e houver sanções, isso tende a ganhar um relevo mais importante na sociedade”, alerta.
Na mesma linha, Thiago Spejo considera que houve avanços por parte dos varejistas, pois antigamente realizavam a coleta de dados sem uma finalidade específica e sem objetivos claros. “Hoje a gente percebe que o varejista está mais consciente em exigir somente os dados que vão ter uma efetividade no futuro”, pondera o CEO da Idever. Em sua avaliação é importante distinguir com clareza quando é importante coletar mais informações do consumidor para saber suas preferências.
Quais providências precisam ser adotadas?
Na visão de Flávio Perboni, a adoção de providências preventivas é fundamental, mas não bastará a empresa fazer uma adequação à norma e parar por ali, o que está colocado na norma é uma continuidade e esses critérios vão ser considerados para abrandar as penas. “As preocupações das empresas devem ir da coleta de dados, tratamentos e compartilhamento em nuvem, buscando uma adequação própria e parceiros que observem a norma da mesma forma, pois aquele que coleta o dado passa a ser responsável por toda essa cadeia”, afirma Perboni.
Já o CEO da Idever acredita que as empresas varejistas já estão adequadas quanto à coleta de dados, mas os colaboradores – em especial os operadores de caixa – precisam saber por que as informações estão sendo coletadas e têm que estar aptos a responder aos clientes. Spejo ressalta que o varejo tem um turn over muito alto e que há que se fazer uma reflexão se os treinamentos dos colaboradores estão sendo adequado.
O varejo está preparado para a LGPD?
Perboni destaca que nós estamos chegando num momento limite para se fazer um inventário do que já foi feito em relação às adequações à LGPD e buscar algum ponto de risco e vulnerabilidade que permanece. O advogado lembra que na minuta da consulta pública estão previstas as penalidades e sanções calculadas sobre o faturamento das empresas, o que pode ser muito impactante no varejo onde o faturamento costuma ser mais alto, mas a margem é baixa.
No tocante às tecnologias para atender às demandas dos varejistas e contribuir às adequações, Thiago Spejo diz que os sistemas da Idever já foram preparados para atender às demandas de proteção de dados. “Hoje o termo de aceite dos clientes Idever mostram claramente os dados que são coletados e suas finalidades, tudo bem claro para que o consumidor entenda o que está acontecendo com os seus dados”, conclui o CEO.
Essas preocupações se tornam mais relevantes neste momento em que a ANPD disponibilizou a consulta pública e se prepara para aplicações de sanções previstas na LGPD. A minuta apresentada deixa claro que o foco está nas boas práticas que as empresas devem implementar e seguir no tocante à transparência, segurança, registros e zelo com os dados.
Segundo o advogado, a reincidência é um fator de agravamento, pois a lei parte da premissa que o dano ao cidadão vai acontecer pela multiplicidade e volume muito grande de dados. “É razoável imaginar que erros acontecerão, mas a lei traz a intenção da empresa como um elemento muito forte quanto a fazer o certo e adotar as providências para que isso aconteça”, relembra Perboni.